sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Nem tão nua nem tão crua

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Admito. Sou mulherzinha com “M” maiúsculo e “inha” com todo o diminutivo a que tenho direito. MULHERZINHA, assim mesmo, em caps lock. Não sei se tenho orgulho disso, mas assumo que esta é a minha verdade.

Independente, bem resolvida, foda, miseravona, passei minha vida construindo uma imagem do que eu não sou, até o dia em que surtei, enlouqueci e fui parar num hospital após ingerir três cartelas de lexotan.

Eu não queria que as pessoas me vissem como uma patricinha chatinha, nojentinha e inhazinha, porque eu tinha todos os pré-requisitos: família tradicional, mimada, roupinhas de marca e uma mãe que me enchia de maquiagens e bijuterias, digamos, finas. Tá, semi-jóias douradas. Daí a minha ojeriza, durante muito tempo, a qualquer coisa dourada.

O auge da minha revolta foi quando minha mãe quis me obrigar a participar de um baile de debutantes. Era um baile tradicional, que, graças a Deus, não existe mais em Brasília, onde as famílias ditas importantes apresentavam as filhas de 15 anos à sociedade. A parte boa era que sempre tinha um ator global para dançar com as donzelas. No meu ano foi o Marcelo Serrado. Ele mesmo, o Crodoaldo Valério, de Fina Estampa. Não, eu não participei. Era muito brega, gente.

As debutantes usavam vestido de noiva. Uma coisa horrorosa. Não, definitivamente, me recusei a participar daquela palhaçada. Cheguei a ir a algumas reuniões. Tinha aulas de etiqueta, dança de valsa e a porra. Minha tia era uma das diretoras do baile. Se eu não participasse seria o fim. O que as pessoas iriam pensar? O que a família ia dizer?

No final das contas, acabei ganhando um som, presente do qual minha mãe passou anos arrependida de ter me dado, porque eu ouvia os dois lados de Cabeça Dinossauro no último volume. Ela vivia dizendo que eu era a decepção da família. Eu adorava ouvir isso. A partir daí passei a ser a rebelde sem causa. Virei crente, depois saí da igreja, cortei o cabelo, pintei de roxo e coloquei um piercing na sobrancelha. Até o analista enlouqueceu.

Achava papo de mulher muito chato e cansativo. Perdia minha paciência com minhas amigas e passei a ter amizade com os meninos. As meninas me odiavam, porque eu estava sempre rodeada dos meninos mais bonitos do colégio. É verdade que eles não me davam bola e me tratavam como se eu fosse um deles, mas me respeitavam, me admiravam, me achavam “retada”. Eu era a foda, a gente boa, massa. As outras eram nojentas, frescas, patricinhas.

O problema é que, no fundo, o que eu queria era ser como as outras, como a minha irmã, a princesinha, a queridinha da família e a cobiçadinha pelos meninos. A que não falava palavrão, a que um dia ia casar e constituir família. Eu queria usar saia curta e ser chamada de gostosa, mas quando eu colocava uma dessas, os meninos riam de mim. “Isso não combina com você”, eles diziam. Talvez aí esteja a explicação de eu ter passado pelo menos 10 anos sem mostrar minhas pernas.

Os meninos nunca queriam nada comigo e por mais que falassem mal das patricetes, era elas que eles queriam. Eu era amiga, confidente e sofria muito, porque era apaixonada pelo meu melhor amigo. Ele nunca soube disso e, hoje, 15 anos depois, prefiro que nem saiba, porque o cara virou um bagulho. Não ele não é mais meu amigo. Parou de falar comigo depois que começou a namorar uma menina que me detestava e o proibiu de falar comigo.

Casar? Deus me livre! Filhos só atrapalhariam minha vida. Era isso o que eu dizia a todo mundo. Mentira que eu sustento até hoje, quando, na verdade, na verdade mesmo, hoje, aos 30, solteira e infeliz, eu admito: ainda ouço Cabeça Dinossauro no último volume, mas também sou mulherzinha sim e quero todo o que elas querem. Quero casar, ter filhos, cuidar da casa, cozinhar e tudo o que uma mulherzinha com M maiúsculo faz. Eu quero, gente. Eu quero muito.

Postado por Renata

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